quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Niemeyer e reflexões patrióticas

De muitas barbaridades que já ouvi em minha vida uma delas merece atenção especial no dia de hoje.

Lembro-me de ouvi-la saindo da boca de uma aluna no curso de inglês no qual eu lecionava, barbaridade essa que até hoje ecoa em minha mente.

Estávamos no meio da aula quando perguntei porque ela queria aprender inglês. Após alguns momentos de silêncio nos quais sua mente estava obviamente maquinando uma resposta conclusiva à tal pergunta incrivelmente abrangente, sua boca se abriu e as palavras finalmente vieram: Ela queria ser uma jornalista e morar nos Estados Unidos. Automaticamente franzi minha testa de maneira quase imperceptível (ou não) em desaprovação involuntária, visto que a terra do Tio Sam não está no topo da minha lista de lugares para morar ou até mesmo visitar. Mas enfim. Fiquei imaginando o porque ela não poderia ser uma jornalista aqui no Brasil, e cometi a infâmia de lhe perguntar o porque. E o porquê veio.

"Ah, quero trabalhar lá fora porque acho que o povo daqui é meio... (momentos de hesitação) ah, sabe, meio.. (mente trabalhando, e reunindo coragem) meio burro."

Continuei olhando-a durante alguns segundos com a expressão mais desprovida de expressão possível. Uma avalanche de diferentes respostas me vieram à cabeça, uma verdadeira torrente de linhas de raciocínio e argumentos explodiram no meu cérebro. Imaginei por um momento qual seria a base lógica para tal afirmação, imaginei depois qual seria a relevância de tal fato, se ele fosse de fato um fato. Entrevi certa arrogância naquela declaração, arrogância que como toda arrogância é fruto da falta de conhecimento, da falta de experiência. Vi também a completa falta de amor à Pátria, não como um amor à bandeira ou um ideal que não existe, mas sim o amor àquelas coisas tão fundamentais, o amor às coisas que você conhece tão bem, o amor à terra que é uma extensão da sua casa, aos rostos conhecidos, aos sotaques acolhedores, aos cheiros conhecidos... Enfim, vi um monte de coisa, pensei um monte de coisa, e senti algumas coisas; e ainda estava olhando-a.

Não me lembro muito bem qual foi minha resposta, ela foi provavelmente atrapalhada por certa impaciência que se levantou após ouvir a resposta (e após o breve silêncio que se seguiu de minha parte). Esta impaciência pode ser justificada se entendermos que ela foi acumulada. Comecei a reparar em certa parcela da juventude um desprezo por tudo que é Brasileiro, principalmente nas áreas intelectuais e artísticas. A resposta de minha ex-aluna é o produto de uma visão completamente equivocada de nossa nação e sua cultura. É a visão que eu vejo entre muitos pseudo-intelectuais por nosso Brasil, e principalmente nas redes sociais. É uma visão que existe como um pressuposto, tão profundo que não é mais notado. Assim como não podemos ver as raízes de uma árvore, essa parcela da população não consegue enxergar nem mesmo o pressuposto, muito menos sua falsidade.

O pressuposto de que falo é a idéia - quase inconsciente - de que somos um povo inferior. E o dia 05 de Dezembro de 2012 tem algo a dizer sobre isso.

"Morre às 21:55 do dia de hoje o arquiteto Oscar Niemeyer."

Morre no dia 05 de Dezembro de 2012 um dos maiores expoentes da arquitetura moderna mundial. Assinou mais de 1000 projetos, dos quais pelo menos quinhentos saíram do papel. Pioneiro em diversas áreas da arquitetura, foi o responsável principal pela construção dos tão famosos prédios de Brasilia, entre outros diversos projetos ao redor do globo. Foi considerado o nono maior gênio vivo em uma pesquisa recente que listou os 100 maiores gênios da atualidade. Personalidade conhecida e admirada, Oscar Niemeyer com certeza é um dos mais eloquentes testemunhos da capacidade tupiniquim.

Minha intenção não é de maneira alguma santificar nosso caro arquiteto, minha intenção é trazer à memória dos Brasileiros que um Brasileiro (entre vários outros) mostrou que não precisamos compartilhar a visão que os gringos (levados pela grande mídia) têm de nós. Gostaria de deixar bem claro que o Brasileiro não é bom apenas em enganar os outros, fazer caipirinha e jogar futebol. Não somos apenas o carnaval e mulheres rebolando ou a selva e casa do Blanka. E acima e além de tudo, não somos uma nação de burros, enquanto a Europa e Estados Unidos são nações de pessoas inteligentes, cultas e profundas. Prova disso é que o Michel Teló ultrapassou a Adele durante um bom tempo nos hits mais tocados na Europa.

Mas enfim. Barbaridade por barbaridade fico com aquela que é pelo menos patriota. Naquele dia não consegui mudar a cabeça de minha aluna, e ela foi embora com a doce ilusão de que Nova York abriga melhores pessoas que aqui. Triste mesmo será quando ela chegar lá e descobrir que o vazio não estava em sua pátria, mas nela mesma.


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